O poder do erro – A cultura da busca do aperfeiçoamento e desenvolvimento contínuo13 min de leitura

O maior erro na vida é o de ter sempre medo de errar.”

Elbert Hubbard

Em uma cultura na qual o medo de falhar encontra-se enraizado no padrão comportamental das pessoas, inúmeras ideias e oportunidades de aprendizagem são diariamente perdidas por puro receio de tentar. Essa aversão ao erro pode se manifestar de diversas formas, seja uma opinião omitida em uma reunião importante por medo de repressão, ou um projeto que nunca sai do papel porque pode ser rejeitado.

Figura 1.0 O poder do erro.

 

A própria programação mental de cada indivíduo alimenta a crença de que o erro é algo negativo, prejudicial ao desenvolvimento e passível de punição. Com o tempo, a pessoa tende a se acostumar a conviver com esse estigma, tolhendo sua capacidade de experimentação para se adequar ao padrão vigente.

No âmbito corporativo, o sistema de gestão da maior parte das empresas também está baseado nessa lógica punitiva, regido por uma hierarquia verticalizada que inibe talentos e inovações.

Nessas organizações, os erros geram um clima de medo, uma vez que a falta de liderança no comando dos departamentos e das próprias companhias associa falhas a castigos, tensão e exposição desnecessária de funcionários.

Nas grandes empresas, por outro lado, equívocos são tratados em um ambiente que mescla reciclagem, aprendizado, responsabilidade e respeito. Nelas, o líder atua como modelo de referência para toda a equipe, buscando o aperfeiçoamento contínuo dos liderados através da chamada cultura do erro.

Tipos de Erro

Quem nunca errou nunca experimentou nada novo.”

– Albert Einstein

Apesar de um conhecido ditado afirmar que “errar é humano”, os fracassos ainda não são aceitos pelas organizações tradicionais. Diante de orçamentos reduzidos e da urgência por lucros, até mesmo pequenos deslizes parecem vergonhosos e os funcionários simplesmente não se permitem falhar.

Recentemente, no entanto, empresas inovadoras da região do Vale do Silício, na Califórnia (EUA), vêm adotando uma estratégia diferente, baseada na mentalidade de que os erros – e as lições aprendidas através deles – são essenciais para o crescimento. Defendem que fracassos podem ser úteis para que colaboradores e empresas se reinventem, criando uma reação profícua na resolução do problema.

Nesse sentido, é importante observar que nem todo erro é igual. De acordo com Amy Edmondson, professora de liderança da Novartis na Harvard Business School, (HBR, 2011), há aqueles causados por desvio de conduta, desatenção, incapacidade e inadequação de processos, que são evitáveis e, portanto, podem ser vistos como condenáveis. Existem também, porém, outros decorrentes de incerteza sobre eventos futuros, complexidade do processo, teste de hipótese ou teste exploratório, que são aceitáveis e até mesmo louváveis, pois produzem conhecimentos valiosos e vantagens competitivas para a organização.

Figura 1.1 Espectro de razões para o erro.

 

Fonte: Adaptado de HBR, 2011. Acesso em: 10/03/2019.

Essa nova abordagem das motivações por trás das falhas em processos organizacionais é imprescindível para que as empresas desenvolvam estratégias eficazes para aprender com os próprios tropeços. Assim, embora diversos enganos sejam possíveis na rotina de trabalho, eles podem ser separados em três principais classes:

Erros evitáveis em operações previsíveis: São os erros de fato ruins, pois representam falhas em procedimentos já bem conhecidos e rotineiros da companhia. Geralmente ocorrem por desvio, distração ou falta de qualificação para desempenhar uma função específica. Costuma ser fácil detectar suas causas e encontrar soluções para esse tipo de erro, empregando-se para isso listas de verificação ou o famoso Sistema Toyota de Produção.

Também conhecido como Toyotismo, o Sistema Toyota de Produção (Toyota Production System – TPS) foi desenvolvido no período entre 1947 e 1975 para elevar a eficiência e a produtividade. Sakichi Toyoda, fundador do grupo Toyota, criou o conceito de Jidoka ainda no começo do século XX, estabelecendo um dispositivo de parada automática em seus teares, que interrompia todas as operações de uma máquina caso um fio se quebrasse. Essa medida proporcionou grandes avanços no controle da qualidade, liberando os funcionários para a execução de tarefas que agregassem mais valor do que a gestão das máquinas. Anos mais tarde, esse conceito simples passou a ser usado em todos os equipamentos, em todas as linhas de produção e em todas as atividades da Toyota.

Erros inevitáveis em sistemas complexos: Muitos erros organizacionais estão relacionados à imprevisibilidade de algumas situações. Em um cenário de incertezas, constituído por pessoas, problemas e demandas novas, o melhor caminho a seguir pode ser especialmente difícil de identificar, gerando falhas nos processos. Embora a adoção de práticas de gestão de risco mais eficientes possa ser útil nesses casos, alguns pequenos problemas tendem a persistir.

Erros inteligentes na fronteira entre o conhecido e a inovação: Erros desse tipo podem ser considerados benéficos, uma vez que indicam a tentativa de fazer algo novo, nunca tentado antes, e geralmente proporcionam aprendizados essenciais para o crescimento da empresa como um todo. Criar um produto inovador e testar as reações dos consumidores em mercados novos são exemplos de contextos que envolvem erros inteligentes. Trata-se de experimentos que devem ser realizados primeiramente em pequena escala para verificar os resultados e feedbacks obtidos, ajustando a estratégia a partir deles.

Erros sempre estarão presentes em processos de inovação e o importante aqui não é combatê-los a qualquer custo, mas sim evitar os velhos erros. Repetir o mesmo erro significa que não houve aprendizado na primeira vez, ou seja, cometer um erro foi inútil. É necessário, portanto, cometer novos erros, extraindo a maior quantidade de conhecimento possível de cada um deles.

 

Cultura do erro

Toda empresa precisa ter gente que erra, que não tem medo de errar e que aprende com o erro.”

– Bill Gates

A multinacional de tecnologia 3M defende que “erros honestos são bem-vindos”. Enganos cometidos com intenção de acertar e fazer descobertas, embora possam provocar transtornos a princípio, são primordiais para a evolução organizacional.

O medo de errar é o maior fantasma de culturas corporativas orientadas à inovação. Por causa desse temor, os funcionários evitam experimentar coisas novas, criar novos processos ou testar novos procedimentos. Eles insistem sempre no mesmo padrão, regras ou processos, muitas vezes sem sequer questionar se eles são mesmo recomendáveis ou não.

Não é fácil de instaurar esse comportamento de tolerância a falhas. A sociedade normalmente não aceita erros, os compradores tampouco, por isso as empresas tendem a rejeitá-los. Erros são tratados de diferentes formas por cada organização, família ou grupo social qualquer, e essa forma particular de lidar com eles é chamada de cultura do erro.

Em um ambiente corporativo tradicionalmente avesso a erros, a companhia farmacêutica Sanofi decidiu convocar seus funcionários para uma votação inusitada: eleger o maior erro cometido na empresa durante o ano de 2017.  O concurso, promovido pela própria organização e batizado de “Oops. Lições aprendidas”, teve 22 candidaturas a “erro do ano” e recebeu votos de 184 colaboradores. Os vencedores – uma equipe de uma das marcas de remédios que divulgou de modo equivocado a distribuição de amostras para médicos – receberam prêmios simbólicos, como um “vale coragem” que manifestava o apoio dos gestores à iniciativa, apesar da falha (SANOFI, 2017).

Essa iniciativa pioneira e criativa da Sanofi ilustra claramente o que as maiores empresas globais já perceberam: antes do acerto é preciso experimentar, testar e errar.

Para sobreviver e prosperar em um mundo caracterizado pelo rápido desenvolvimento tecnológico, diversas empresas iniciaram uma corrida para produzir mais inovação internamente. Nesse cenário, a mais nova ideia é adotar o hábito de expor os erros, estimulando os funcionários a conversar sobre eles, trocar experiências e transmitir o que aprenderam.

Essa tendência foi seguida também pela Siemens PLM, onde são realizadas reuniões de avaliação ao final de projetos estratégicos. Nelas, os colaboradores se reúnem e estudam o que funcionou e o que pode ser considerado uma lição aprendida. A partir desses encontros são produzidos relatórios finais, que são armazenados posteriormente em um sistema de informações interno e podem ser consultados por qualquer funcionário. A gerente de RH da Siemens PLM, Naira Barros, é uma das grandes defensoras dessa metodologia: “As reuniões de troca de experiências e avaliações de projetos são bastante importantes, pois assim aprendemos a lidar com o erro. Compartilhar essas informações internamente evita problemas similares no futuro”, explica (SIEMENS PLM, 2019).

A despeito dos recentes avanços na mentalidade de muitos empresários, a ousadia e a experimentação ainda precisam superar grandes obstáculos dentro de muitas organizações. Esse fato foi ratificado por uma recente pesquisa da professora de Harvard Francesca Gino, com 250 empregados de uma empresa. Gino fez um questionário para mensurar a curiosidade desses colaboradores recém-contratados, repetindo-o após 6 meses. Na segunda medição, verificou uma queda de 20% no nível de curiosidade deles. E mais: em outro estudo, 70% dos 3 mil entrevistados relataram dificuldades para questionar práticas da organização, enquanto somente 24% disseram sentir curiosidade no ambiente de trabalho (GINO, 2018).

O Instituto Europeu de Administração de Empresas (INSEAD) também realizou um estudo nesse sentido, ouvindo 23 mil profissionais de todos os níveis hierárquicos em diversas companhias. Concluiu que, embora 83% dos executivos relatem encorajar “bastante” a curiosidade nas suas empresas, apenas 52% dos demais funcionários concordam com eles. E enquanto 50% dos gestores creem que a curiosidade é recompensada financeiramente, só 16% dos demais profissionais têm a mesma opinião (SSIR, 2019).

Pedro Waengertner, cofundador da ACE, aceleradora de startups e investimentos que faz projetos de inovação dentro de grandes companhias, defende a importância de transformar as empresas em espaços mais receptivos à curiosidade e mais tolerantes ao erro. Por isso, a ACE investe em projetos de inovação corporativa fundamentados na experimentação ágil, na ideia de “errar rápido e errar barato”: “Nesse contexto, o líder tem que ser um facilitador, mas nós não fomos educados para isso”, conclui Waengertner (ACE, 2019).

A inovação é um dos principais alicerces para o sucesso empresarial nos dias de hoje, por isso contar com profissionais que acreditem nessa filosofia dentro do ambiente de trabalho é fundamental para que a organização trace estratégias exitosas e atinja as metas propostas.

A pesquisa Best Companies for Leadership, conduzida pela consultoria Hay Group desde 2005 para apontar as 20 melhores empresas para liderança ao redor do mundo, revela que todas as organizações avaliadas possuem líderes que consideram a inovação positiva e a incentivam nos processos corporativos.

Essas companhias inovadoras priorizam a descentralização da tomada de decisões, criando espaço para que ideias e soluções surjam nas matrizes e em suas subsidiárias. Todos os funcionários são estimulados pela gestão a contribuir nesse processo. Por isso, empresas que não possuem ferramentas adequadas para o desenvolvimento de líderes dificilmente conseguem garantir a inovação em seus negócios.

Transformando erros em aprendizados: Detecção, análise e experimentação

“Aquele que nunca pecou é menos confiável do que aquele que só pecou uma vez. E alguém que tenha cometido muitos erros – embora nunca o mesmo erro mais de uma vez – é mais confiável do que alguém que nunca cometeu nenhum.”

–  Nassim Nicholas Taleb

A cultura do erro de uma organização define como o erro é tratado nela. Um bom líder deve assegurar que a empresa utilize uma abordagem adequada para aprender com as falhas.

Para tanto, há três etapas cruciais para lidar com elas (HBR, 2011):

Detecção do erro: Embora identificar erros possa ser fácil às vezes, muitas empresas tendem a ocultar falhas o máximo possível, deixando-as encobertas enquanto não provocam danos óbvios ou imediatos. O ideal, porém, é expor o problema o quanto antes, prevenindo que persista e se torne muito mais complicado de solucionar.

 

Figura 1.2 Detecção do erro.

 

Apesar de existirem diversos métodos eficazes para descobrir erros iminentes, eles geralmente são bastante subutilizados. Ouvir os consumidores e adotar a gestão da qualidade total são medidas interessantes para promover a detecção precoce de práticas inadequadas.

Análise: Ao encontrar uma falha, é preciso antes de tudo buscar compreender a origem do problema. Isso exige disciplina para garantir que não apenas o problema seja resolvido, mas também que a lição correspondente seja devidamente aprendida por toda a equipe, evitando assim recorrências. Análises minuciosas e sistemáticas são fundamentais nesse sentido, assim como não minimizar a própria responsabilidade e culpar fatores externos pelo ocorrido.

Experimentação: A ideia de produção estratégica de erros pode parecer estranha a princípio, mas é importantíssima para promover um aprendizado mais efetivo. Cometer erros inteligentes – na hora e no lugar certos – visando apenas aprender e inovar tornou-se uma regra nas maiores empesas do mundo. Dessa forma, elas realizam pequenos testes e simulações com verba reduzida para evitar grandes falhas em processos oficiais de larga escala.

O filósofo chinês Lao Tzu já dizia: “O fracasso é a base do sucesso”. A FELLIPELLI acredita que, muito além de meros equívocos, os erros podem e devem gerar força e experiência para prosseguir e inovar. Por isso, disponibilizamos assessments e cursos exclusivos para o desenvolvimento da inteligência emocional, da liderança e do trabalho em equipe, habilidades fundamentais para lidar com as falhas de modo mais inteligente e vantajoso.

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Para saber mais:

  • Erros Incríveis. Paul Schoemaker. Editora Elsevier, 2012.
  • Fracasso e acaso: Uma reflexāo sobre erros, acertos e o papel do aleatório em nossas vidas. Ricardo Horowicz e Luiz Alberto Py. Rocco Digital, 2018.
  • Aprender com os Erros: O Erro como Estratégia de Mudança. Saturnino de la Torre. Editora Penso, 2007.
  • Lina e o Poder do Erro: Ensinamentos de uma personagem de João Guimarães Rosa. Rodrigo do Prado Bittencourt. Novas Edições Acadêmicas, 2018.

 

Referências bibliográficas

 

 

Tema principal: Liderança e Cultura Organizacional.

Subtemas: Cultura do erro, tipos de erro, novas abordagens – A importância das falhas para a promoção do aprendizado organizacional.

Objetivo: Desenvolvimento Organizacional, Desenvolvimento de Liderança, Desenvolvimento de Equipe, Team Building, Coaching, Coaching nas empresas.

 

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