Tipos Psicológicos e desenvolvimento do ser15 min de leitura

A essencialidade do autoconhecimento para a plenitude do ser, discorrendo-se sobre a dinâmica, o balanceamento e o desenvolvimento dos Tipos Psicológicos.

Por Absolon Macedo

Introdução

Conta-se que um amigo de Sócrates perguntou à pitonisa do templo do oráculo de Delfos quem era o maior sábio da Grécia, tendo essa vidente respondido prontamente: “Sócrates de Atenas”. Ao saber disso, o filósofo disse ao amigo: “Sabes por que a profetisa me considera o mais sábio de todos? É porque eu conheço a minha ignorância…”. Para os socráticos, o conhecimento da própria ignorância é o início da sapiência.

Nesse contexto, acrescentamos a percepção de Jung de que o grande pecado do ser humano é a inconsciência de si mesmo. Combinando as perspectivas desses dois pensadores, descortina-se um quadro com o pior dos cenários em que o indivíduo ignora a própria ignorância sobre o seu EU.

Considerando que o agir segue ao ser (agere sequitur esse), concluímos que somente sabendo quem verdadeiramente somos é que poderemos agir em conformidade com o nosso ser e tornarmo-nos cada vez mais plenos.

Retornando a Delfos, constata-se a essencialidade atribuída ao autoconhecimento desde a Antiguidade por este alerta inscrito no portal do santuário lá erigido para consagração a Apolo: “Conhece-te a ti mesmo” (gnôth seautón). Esse preceito tornar-se-ia não apenas o mote do pensamento de Sócrates, mas também o princípio basilar do saber filosófico grego.

classical statue of Socrates from side, under blue sky
Figura 1 Sócrates, tido como sábio por reconhecer a sua ignorância.

Já se pensava naquele tempo que o indivíduo não pode conhecer o mundo ao redor dele (kósmos), nem o mundo acima dele (theós), sem primeiro conhecer o mundo dentro dele (ânthrophos), pois ele emprega o seu próprio EU para conhecer.

Os objetivos da identificação do Tipo Psicológico

Os objetivos fundamentais da identificação do Tipo Psicológico contemplam o desenvolvimento do ser, a partir do aprofundamento de seu autoconhecimento, e a melhoria de interação entre as pessoas, a partir do maior entendimento dos modos operativos dos outros.

A identificação do Tipo Psicológico possibilita uma melhor compreensão das características pessoais e suas implicações mais frequentemente associadas a cada tipo.

Características pessoais e implicações associadas ao Tipo Psicológico

Pontos fortes e comportamentos eficazes; pontos cegos, áreas potenciais para crescimento e barreiras potenciais à eficácia comportamental; como os outros o veem; modo de aprendizado; fatores motivacionais; carreiras profissionais, ambientes de trabalho, tarefas e papéis mais atraentes; estilo geral de trabalho; padrões de comunicação; atuação em grupo; relacionamento com mudanças; estilo geral de liderança; mentalidade empresarial; processo decisório; administração de conflitos; resolução de problemas; comportamentos relacionados ao estresse.

Tendo em mente os objetivos fundamentais da identificação do Tipo Psicológico, podemos vislumbrar o amplo escopo de sua aplicabilidade, abrangendo, entre outros: Relacionamentos; Carreiras; Educação; Espiritualidade; Aconselhamento; Psicoterapia; Coaching; Processos Organizacionais (liderança, desenvolvimento de equipes, comportamento organizacional em geral).

As preferências dos Tipos Psicológicos

A identificação do Tipo Psicológico caracteriza quatro preferências pessoais básicas. A intenção é apontar uma escolha habitual do indivíduo entre alternativas opostas (dicotomias), assumindo-se que este use ambos os polos de cada uma das quatro preferências, mas que responda primeiro ou mais frequentemente com as suas funções e atitudes preferenciais. Esse processo não se presta para avaliação de habilidades, estresse, inteligência, patologias psíquicas, emoções e maturidade.

Por meio dessa identificação a pessoa toma ciência das preferências de suas funções mentais relativas às formas de (1) Percepção dos estímulos externos que lhe chegam (Sensação ou Intuição – S ou N) e (2) Julgamento para tomar decisões (Pensamento ou Sentimento – T ou F) a partir desses estímulos. Também possibilita observar as atitudes preferenciais do indivíduo relativas a: (3) Direcionamento de energia vital (Extroversão ou Introversão – E ou I) e (4) Relacionamento com o mundo externo (Percepção ou Julgamento – P ou J).

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Figura 1.1 Observando as atitudes preferenciais do indivíduo.

Funções mentais

(1) Percepção: – Qual destas descrições parece ser mais natural e confortável para você?

Sensação (S): Presto atenção à realidade física, o que eu vejo, ouço, toco, saboreio e cheiro. Preocupo-me com o que é real, presente, atual. Observo atos e lembro-me de detalhes que são importantes para mim. Gosto de ver a aplicação prática das coisas e aprendo melhor quando vejo como usar o que estou aprendendo.

Intuição (N): Presto atenção às impressões ou ao significado e padrões da informação que me chega. Aprendo melhor pensando sobre o problema do que por experiência prática. Interesso-me por novas coisas e pelo que pode ser, de forma que penso mais sobre o futuro do que o passado. Gosto de trabalhar com símbolos ou teorias abstratas, mesmo que não saiba como as aplicarei. Lembro-me de eventos mais como impressão do que aconteceu do que dos fatos reais que ocorreram.

(2) Julgamento: · Qual destas descrições parece ser mais natural e confortável para você?

Pensamento (T): Quando decido, gosto de encontrar a verdade ou o princípio básico a ser usado como referência, independentemente da situação específica em questão. Gosto de analisar os prós e os contras e de, então, ser consistente e lógico no processo decisório. Tento ser impessoal, de forma que não deixo que meus desejos pessoais – ou de outros – me influenciem.   

Sentimento (F): Acredito que posso decidir melhor ponderando aquilo com que as pessoas se importam e os seus pontos-de-vista. Preocupo-me com valores e com o que é melhor para as pessoas envolvidas. Gosto de optar pelo que estabelecerá ou manterá a harmonia. Em meus relacionamentos, pareço ser cuidadoso, caloroso e diplomático.

Atitudes

(3) Direcionamento de energia vital: · Qual destas descrições parece ser mais natural e confortável para você?

Extroversão (E): Sinto-me energizado por envolvimento ativo em eventos e diferentes atividades. Acho excitante estar junto a pessoas e aprecio estimular os outros. Gosto de entrar em ação e fazer coisas acontecer. Em geral sinto-me em casa no mundo. Muitas vezes entendo melhor um problema quando falo sobre ele e ouço o que os outros acham do mesmo.     

Introversão (I): Sinto-me energizado ao lidar com ideias, imagens, memórias e reações alojadas no meu mundo interno. Muitas vezes prefiro fazer as coisas sozinho, ou junto a uma ou duas pessoas com as quais me sinto confortável. Despendo tempo refletindo para que tenha uma ideia clara do que fazer quando decidir agir. Ideias são quase coisas concretas para mim. Às vezes prefiro a ideia da coisa do que a coisa em si. 

(4) Relacionamento com o mundo externo: · Qual destas descrições parece ser mais natural e confortável para você?

Percepção (P): Uso minha função mental de Percepção (Sensação ou Intuição) no meu mundo externo. Para os outros, pareço ter um estilo de vida flexível e espontâneo. Prefiro entender e adaptar-me ao mundo do que tentar organizá-lo. Os outros me veem como uma pessoa aberta a novas experiências e informações.    

Julgamento (J): Uso minha função mental de Julgamento (Pensamento ou Sentimento) no meu mundo externo. Para os outros, pareço ter um estilo de vida planejado ou disciplinado. Gosto de lidar com coisas estruturadas e organizadas. Sinto-me mais confortável quando decisões são tomadas e procuro ter a vida sob controle tanto quanto possível.

Devemos ter cuidado para não confundirmos a denotação da terminologia adotada para as preferências dos tipos psicológicos com a conotação desses termos no senso comum: Extrovertido não significa “tagarela”, Introvertido não significa “tímido”, Sentimento não significa “sentimental”, Julgamento não significa “juízo de valor” e Percepção não significa “perspicaz”. 

Outro pressuposto da tipologia de personalidade é que sempre uma das duas funções mentais (Percepção ou Julgamento) se apresentará na atitude Extrovertida (E) e a outra na atitude Introvertida (I) – independentemente de a pessoa ter como preferência de atitude de direcionamento de energia vital a Extroversão (E) ou a Introversão (I).

Dessa maneira, se a preferência de atitude para o mundo externo (“modo extrovertido”) por parte do indivíduo for a Percepção (P), este terá uma função mental de Percepção – S ou N – necessariamente extrovertida e, consequentemente, terá uma função mental de Julgamento – F ou T- introvertida.

Enquanto a função mental extrovertida caracteriza-se por apresentar uma estrutura de referência externa, amplitude, ação, contemporaneidade, coletividade, objetividade e ser energizada na interação, a função mental introvertida caracteriza-se por apresentar uma estrutura de referência interna, profundidade, reflexão, atemporalidade, individualidade, subjetividade e ser energizada na solitude.   

Os dezesseis Tipos Psicológicos são denominados por meio das combinações de oito letras (E, I, S, N, F, T, P, J) designando quatro preferências individuais, as quais, quando observadas isoladamente, apresentam características comportamentais próprias que são moldadas quanto configuradas em conjunto.

Em outras palavras, um tipo ISTJ não é simplesmente a “soma” das características dessas quatro letras consideradas per si, mas uma interação destas entre si.

Tipos Psicológicos

A Dinâmica dos Tipos Psicológicos

As quatro funções mentais (S, N, F, T) têm áreas específicas de especialização, sendo direcionadas para diferentes domínios de atividade.

Se todas as funções mentais tivessem pesos iguais, a personalidade ficaria sob a égide de propósitos cruzados, carecendo de um direcionamento consistente.

Na teoria dos Tipos Psicológicos, uma das funções mentais é a principal (função mais consciente e desenvolvida de todas), sendo sua oposta a inferior (função menos consciente e diferenciada de todas); outra destas será a auxiliar (função secundária que fornece equilíbrio para a principal), sendo sua oposta a terciária (função menos consciente do que a principal e a auxiliar).

Assim, por exemplo, um tipo ENFP apresenta a Intuição (N) como função principal, o Sentimento (F) como função auxiliar, o Pensamento (T) como função terciária (oposta à auxiliar) e a Sensação (S) como função inferior (oposta à principal).

Nesse exemplo, a função principal Intuição (N) – uma função de Percepção – apresenta-se na atitude Extrovertida (E) – note que a atitude para o mundo externo (“modo extrovertido”) do ENFP é a Percepção (P). Essa função principal é equilibrada pela função auxiliar Sentimento (F) – uma função de Julgamento – que se apresenta nesse caso na atitude Introvertida (I). Observe ainda que esse tipo apresenta como atitude de direcionamento de energia vital a Extroversão (E).

Ressalta-se, por fim, que todas as funções mentais da pessoa são importantes, mas a secundária, a terciária e a inferior são subordinadas e servem aos objetivos da principal que mantém sob seu controle a maior parte da energia psíquica disponível.

O balanceamento dos Tipos Psicológicos

Tendemos a pensar que balanceamento do Tipo Psicológico significa manter-se equilibrado no meio da escala entre duas preferências opostas. Na verdade, esse balanceamento refere-se ao grau em que a função principal e a função auxiliar estão operando em conjunto: a função de Percepção – S ou N – e a função de Julgamento – F ou T – comunicando-se entre si e fazendo com que se despenda um tempo adequado (mas não igual) em atitudes Extrovertidas (E) e atitudes Introvertidas (I).

Dito de outra forma, balanceamento em tipologia de personalidade refere-se a não se vivenciar demasiadamente a Percepção (ser “muito P”) em detrimento do Julgamento – obtendo muitos dados com poucas decisões – ou, ao contrário, se exercitar exageradamente o Julgamento (ser “muito J”) em detrimento da Percepção – fechando questões muito rapidamente sem informações suficientes para decidir.

A regulação do grau que a pessoa se engaja no mundo interno ou externo, estimulando a função mental (S ou N e F ou T) de cada atitude (E ou I), é um ponto de alavancagem eficaz para o balanceamento do seu Tipo.

O desenvolvimento dos Tipos Psicológicos

A teoria junguiana da tipologia de personalidade estabelece que nossas preferências são determinadas e imutáveis, mas o grau de uso dos elementos de todos os Tipos Psicológicos está continuamente em desenvolvimento.

O sucesso em qualquer empreendimento da vida demanda que cada função mental seja usada em variados graus, em diferentes momentos. Entretanto, não se deve buscar o desenvolvimento equitativo de todas as funções mentais desde que, por natureza, não as usamos da mesma forma. As pessoas tornam-se mais eficazes quando desenvolvem seu estilo natural e aprendem a usar as suas funções não preferidas em situações apropriadas.

Em síntese, o objetivo maior nesse processo é desenvolver adequadamente uma função mental mais consciente dominante (função principal) e uma função mental menos consciente e compensatória de equilíbrio (função auxiliar). Em adição, deve-se adquirir certas habilidades necessárias pertinentes às funções mentais menos desenvolvidas (funções terciária e inferior) para uso consciente e objetivado destas em tarefas selecionadas ou por períodos limitados de tempo. 

O crescimento pessoal e a construção sobre as diferenças  

Multiethnic business people talking and smiling during meeting in office. Mature middle eastern man explaining proposal. Happy businessman showing project and marketing strategy on laptop to colleague
Figura 1.2 A conscientização do Tipo Psicológico leva à valorização do outro e a um melhor relacionamento interpessoal.

A conscientização sobre o Tipo Psicológico, suas características e implicações, pode auxiliar o indivíduo a desenvolver uma maior aceitação dele mesmo e uma percepção mais acurada da rota adequada para o seu crescimento pessoal. Corrobora-se, assim, o pensamento de Heráclito de que todos têm a capacidade de se conhecer e de agir com adequação

Em adição, quando percebemos que as pessoas se comportam de maneiras que são extensões naturais de seu Tipo, passamos a compreender melhor e a valorizar mais o outro, pavimentando assim o caminho para o desenvolvimento interpessoal – construindo sobre as diferenças.

É da obrigação moral de cada um buscar sempre a melhor condição possível para alcançar a harmonia integral do seu ser. Esse é um processo que nunca tem fim e que exige uma melhoria contínua de sua própria dinâmica. O indivíduo é o melhor instrumento de si mesmo, sendo o autoconhecimento a quintessência do modus operandi de refinamento desse instrumento.

Sobre o Autor

Absolon Macedo – Consultor e professor de pós-graduação de Filosofia do Comportamento Humano e de Liderança e Comportamento Organizacional, com diversas graduações internacionais, de Engenharia, passando por Administração, Psicologia Geral e Analítica das Organizações, Filosofia e Sociologia do Trabalho e da Saúde Mental, chegando à formação em Psicologia do Comportamento Social no CAPT-OKA/EUA, com Treinamento em diversos institutos Junguianos dos EUA e Aperfeiçoamento no Jung Institut Zurich/Suíça;  qualificação e certificação para aplicação do MBTI®  (Steps 1, 2 e 3) e do PMAI (Estrutura Arquetípica) pelo CAPT/EUA, e do EQ-2.0/EQ – 360 (Inteligência Emocional) pelo MHS/EUA, além de participante ativo dos Programas da Fellipelli Consultoria Organizacional.

Referências bibliográficas

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  • KROEGER, O.; THUESEN, J.; RUTLEDGE, H. Type talk at work. Fairfax: OKA, 2003.

Para aprofundamento no assunto, assista à palestra: “Tipos Psicológicos: Construindo sobre as Diferenças” por meio do link https://youtu.be/Sfmx-shvIHA.

Tema: MBTI®

Subtema: MBTI® e seu amplo escopo de aplicabilidade para desenvolvimento pessoal e profissional.

Objetivo: Autoconhecimento, Autodesenvolvimento, Desenvolvimento de Carreira, Desenvolvimento de Equipes, Desenvolvimento de Liderança, Desenvolvimento Organizacional, Coaching, Coaching nas Empresas.