O momento eleitoral e nossas emoções13 min de leitura

Neurociência: a mãe da neuropolítica

O corpo é um pensamento mais admirável do que a antiga ‘alma’”.

– Nietzche

É verdade que o estudo das emoções, da mente e do comportamento humano vem ganhando cada vez mais espaço entre os pesquisadores e estudiosos no assunto desde a fundação da Psicologia.

Logo, debruçar sobre a psicologia política e a Neurociência é fundamental para entender como o cérebro e a mente interagem a partir dos eventos externos e determinam as emoções que são sentidas. Este desafio não é apenas da ciência e da psicologia, mas também da neuropolítica – emprestando base à Neurociência e ao neuromarketing.

O desenvolvimento de técnicas, como a neuroimagem e do modelo teórico de inteligência afetiva, têm sido de grande ajuda para relacionar as estruturas aos nossos comportamentos no campo da política. Quais os critérios que usamos para escolher os candidatos?

Seguindo Lavareda (2011), as emoções e sentimentos têm capacidade discriminatória e, desse modo, capacidade de interferir nas nossas escolhas.

Lições das emoções

Quanto mais emocional é uma pessoa, maior a probabilidade de que ela seja dominada pela obsessão, desilusão e demagogia

[…]

. E quanto mais intensa a emoção, menor o comando da mente” (MARCUS, 2003).

As emoções são reações complexas e estimuladas tanto pelo ambiente ao nosso redor quanto pelas nossas crenças, desejos e esquemas mentais. O processo de interpretação de uma situação é tão rápido que o nosso consciente sequer desconfia que possui tamanhas emoções. A maioria dos autores das áreas da psicologia e Neurociência se refere sem distinção às emoções e aos sentimentos.

Para o neurolinguista americano George Lakoff (2009), 98% do processo cognitivo se verifica de forma inconsciente. Ele ainda acredita que a relação “vítima e vilão” são partes que reagem à nossa mente para a tomada de decisão.

Mas o fato é que, embora emoção e cognição sejam distintas, elas estão interligadas. Ao interpretar que uma situação tenha sido benéfica ou prejudicial, nosso cérebro faz uma avaliação automática cuja resposta é uma sensação física e emocional, baseada nos estímulos recebidos e processados sob a ótica do que é bom ou mau. Como disse Lazarus (1994), a “avaliação envolve inteligência e raciocínio”, isto quer dizer que as emoções também passam pelos processos de julgamentos morais.

Nessa perspectiva, o lugar que nascemos e o ambiente em que crescemos, o status socioeconômico, as relações pessoais (família, amigos que temos, professores), as experiências vividas fazem parte da educação recebida, e poucas coisas têm mais força e influência de nos moldarmos do que a educação.

Embora haja interpretação cognitiva, as emoções influenciam a nossa aprendizagem, memória, razão e linguagem de acordo com a intensidade que as sentimos.

As emoções são tão importantes no nosso dia a dia que qualquer reação emocional é percebida por todos. Quando uma pessoa se sente frustrada, por exemplo, ela pode interpretar aquele sentimento em decorrência de uma decepção e tristeza de forma mais ou menos consciente. Entretanto, isso não significa que uma pessoa que tenha um pensamento mais frio – do ponto de vista racional – tome uma decisão correta.

Os sentimentos contribuem e impactam a nossa vida. Eles são alertas negativos e positivos gerados por situações que foram capazes de ocasioná-los, mas que ainda podem ser alterados por novas percepções.  O reconhecimento da emoção ajuda a entender como nos sentimos e nos adaptamos à situação.

Os esquemas mentais no processamento de informações e decisão política

Dentro da psicologia cognitiva, os esquemas são representados a partir de um modelo de rede associativa. Esse modelo tem se mostrado bastante relevante para a compreensão da maneira como as informações interagem na produção de esquemas e, consequentemente, na ativação de heurísticas para a tomada de decisão eleitoral. Ele estabelece que o processamento de informações é organizado por duas estruturas mentais: uma memória de longo prazo (LTM) e uma memória de trabalho (WM)”  (PIMENTEL, 2007).

A nossa memória é parte da nossa identidade, é onde armazenamos as informações aprendidas. Cada vez que um indivíduo recebe novas informações, ele as processa de acordo com o que foi armazenado. As memórias de longo prazo nada mais são do que as crenças e a educação predispostas nos indivíduos, já as memórias de trabalho são voláteis e temporárias, às vezes, é aquilo que deixamos de salvar no nosso cérebro.

Por essas argumentações, então, podemos compreender o processo de rede associativa no campo político como sendo estruturas separadas, mas correlacionadas, por exemplo, o candidato, o partido e os temas associados como “combate à miséria” ou “corrupção” ou “aumento do número de desempregados”. A cada associação feita pelo eleitor, suas crenças e informações processadas são consideradas e representadas. Quanto maior sua crença e capacidade de representação, maior sua ativação e força.

Seguindo essa ótica, se o eleitor utilizar das características pessoais dos candidatos para fazer suas associações com cada estrutura, a projeção será de um candidato de modelo ideal. Por isso, os apelos emocionais, desempenhados nas narrativas dos candidatos durante a campanha eleitoral, podem ser decisivos na escolha do representante político.

Neuropolítica: palavras comunicam sentimentos

Assim como as empresas investem milhões de dólares para entender o comportamento de seus consumidores e criar narrativas que as aproximem mais deles – e faz uso do da Neurociência e do Marketing como ferramentas –, no campo político essa premissa não seria diferente. O critério de escolha de um produto dentre os expostos nas gôndolas é levar aquele que nos atrai e consideramos melhor, embora, às vezes, não seja o ideal. As comparações na hora da escolha são importantes, seja na esfera consciente ou inconsciente. Então, podemos entender que a opção eleitoral é similar à logica de escolha de um consumidor.

Cientistas políticos e psicólogos americanos realizaram uma pesquisa para estudar as reações cerebrais de republicanos e democratas – publicada pela revista Nature Neuroscience –, que demonstrou que havia tendências implícitas por trás das preferências partidárias. Os cientistas notaram que os conservadores eram mais estruturados, organizados e persistentes, ao passo que os liberais eram mais receptivos e abertos a novas experiências. A investigação ainda apontou que essas características dos perfis estavam relacionadas ao processo cognitivo.

No Brasil, há estudos que se debruçam nos aspectos não racionais do voto, “O novo eleitor não racional”, de Flávio Silveira (1996), “Razão e emoção no voto”, de Jairo Pimentel, “A decisão do voto nas eleições presidenciais brasileiras”, de Yan Carreirão (2002) e “Determinantes do comportamento eleitoral: a centralidade da sofisticação política”, tese de doutorado de Castro (1994).

Outro estudo realizado nos EUA, pelo psicólogo Drew Westen, no qual questionava os sentimentos das pessoas sobre determinados assuntos, apontou que 80% das respostas eram muito previsíveis, tamanha a percepção que os entrevistados tinham. Perguntados se o representante político disse a verdade ou mentiu, por exemplo, a maioria das opiniões dos entrevistados permanecia as mesmas, ainda que os fatos apresentados fossem diferentes.

Não obstante, a tese de mestrado de Pimentel, que trabalhou com o modelo de inteligência afetiva, mostrou que os eleitores que mais sentiram o impacto dos fatos negativos divulgados sobre o presidente Lula ou seu partido em 2006 eram exatamente os que tinham uma boa avaliação do seu governo.

No livro “O Cérebro Político”, Westen mostra, neste campo, que o nosso cérebro pensa em forma de etiquetas ideológicas, cujas palavras escolhidas se encaixam de acordo com cada grupo. Por isso, para ele, mais do que as propostas de governo, as narrativas feitas pelos partidos e seus políticos influenciam fortemente as nossas decisões.

Seguindo o pensamento de Lakoff de que as metáforas têm grande poder sobre o pensamento e acabam consolidando as ideias à medida que vão sendo reforçadas pelos discursos, essas conexões cerebrais geram as emoções e sentimentos. Se existe um sentimento positivo por um candidato a tendência é que ele seja beneficiado, por outro lado se não houver, ele será visto de forma negativa.

Mas é importante lembrar que cada emoção é gerada em um contexto específico, cuja interpretação vai determinar qual a emoção será sentida.

Embora haja essas conexões, não é impossível levar o eleitor a mudar de ideia. Porque nem todo eleitor está convicto de suas posições políticas. Ele pode ter opiniões ora conservadoras ora liberais em diferentes assuntos.

Se você diz a verdade sobre o que acredita, as pessoas estão mais suscetíveis a ouvir a sua mensagem. E elas estão ainda mais suscetíveis de serem receptivas, se o que você sente convergir com o que elas sentem” (Westen, 2007).

Inteligência Emocional é o antídoto na hora do voto?

A crise política brasileira mostra o momento estético que estamos vivendo: seria cômico se não fosse trágico. Nossa feição é estarrecedora, nosso estado mental é fragilizado, a explosão de sentimentos é exacerba a cada novidade política, candidato e campanha. E no meio dessa estrada, entre mentiras e verdades, é preciso ter fôlego e Inteligência Emocional para passar ileso.

A premissa estabelecida por políticos e marqueteiros de que emoções são significativamente importantes na definição do voto faz tanto sentido quanto as várias manifestações que tomam as ruas, os panelaços nos bairros, os discursos de ódio e raiva destilados pelas redes sociais, o amor cego à imagem de um político, e a esperança exposta aos olhos de milhões de desempregados.

Se situação ou se oposição, o que ambas têm em comum é que a certeza brota do afeto, seja ódio seja amor, e não da racionalidade. Nesse caso, “os eleitores votam pela reeleição de governos que consideram satisfatórios e punem com seu voto na oposição governos que consideram ruins” (PIMENTEL, 2007).

É preciso deixar de lado os sentimentos ligados à personalização do político, e voltar nosso olhar à racionalidade da escolha. Analisar as propostas futura de acordo com a experiência presente, considerando as posições ideológicas, partidárias e de discurso tangíveis, também, ao momento político atual. Afinal, o modo como a política se apresenta, sua própria aparência, é a verdade.

Por essa razão, o indivíduo também está condicionado a fazer esta análise com base em sua vivência passada, e cair em promessas está cada vez mais difícil. E a tendência de se basear em esquemas mentais intuitivos é maior do que avaliar as previsões que um candidato faz.

A raiva, indignação e medo influenciam o eleitor na hora da sua escolha, da mesma forma que o entusiasmo e a esperança não são suficientes para decidir a eleição.

Em sua tese, entretanto, Pimentel pondera, e diz que os eleitores brasileiros vão além da questão ideológica e partidária na hora de decidir o voto. Os brasileiros avaliam o governo em exercício comparado ao governo passado, além de processar certos atributos dos candidatos, como traços da personalidade, para chegar a uma decisão racional.

Envolver-se em debates, participar de discussões e reflexões, entender como funciona o processo eleitoral, o papel dos partidos e dos cargos políticos, ler as propostas e prestar atenção nos debates auxiliam ao se preparar para fazer a escolha com maior consciência.

Os meios de comunicação contribuem na expansão do Marketing político do candidato/partido e podem acabar gerando estímulos ao eleitor. O corpo a corpo, o discurso, a forma como se veste, as expressões faciais, os comerciais em programas de televisão e rádio, os canais na internet, como site e redes sociais, também mobilizam o nosso processo sensorial de escolha.

Votar em nulo ou em branco não é disponibilizar o seu voto para o candidato que estiver à frente na corrida eleitoral, mas é aceitar que você será governado por aquele que a maioria escolher. E não é virando as costas para a política que você terá as soluções para ela.

Em uma democracia, a cooperação e a humanização do outro perante a sua opinião se fazem necessárias. Saber identificar, avaliar e gerenciar suas próprias emoções, bem como as dos candidatos, são diferenciais que o torna não só capaz de lidar com as adversidades do dia a dia, mas de pensar criticamente sobre cada discurso e comportamento político.

Em momentos de pressão e empasse, comuns durante campanhas eleitorais, é preciso ter calma para escolher o seu melhor candidato e impedir que suas emoções extravasem e desestabilizem sua escolha. Ter consciência para entender qual é a proposta ideal de governo exige certo esforço. Não sejamos impulsivos… É importante avaliar todas as possibilidades.

Não deixa de ser uma virtude da democracia que os destinos de um país sejam definidos pelos mais moderados”, diz Hélio Schwartsman.

Como vimos, vários fatores podem determinar e influenciar as tomadas de decisão, mas é notório que o cérebro e a mente humana são o processo para essa decisão, e isso se reflete também neste momento eleitoral, na hora do voto.

Referências bibliográficas

Tema principal: Inteligência Emocional e Neurociência.

Subtemas: Uma abordagem das emoções em relação ao momento eleitoral e os esquemas mentais no processamento de informações na tomada de decisão política.

Objetivo: Inteligência Emocional, Neurociência, Neuropolítica, Gestão de Conflitos, Autoconhecimento, Autodesenvolvimento, Coaching, Neurocoaching.


Veja também

PODCAST: Inteligência emocional e liderança assertiva

Clique aqui

Reader Interactions

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *