Como explorar o conceito de arquétipo no contexto empresarial e reforçar sua marca de forma mais alinhada às preferências e demandas de seu público-alvo dentro da organização.
O pêndulo da mente se alterna entre perceber e não perceber, e não entre certo e errado.” – Carl Jung
Símbolos, sinais e imagens sempre foram utilizados pelos seres humanos para assegurar a comunicação eficiente e o cumprimento das normas sociais. Entre os povos antigos, como os egípcios, gregos e romanos, os chamados arquétipos já estavam presentes, sendo empregados para representar valores e qualidades como beleza, inteligência, força, poder, etc.
O termo arquétipo é derivado do grego arkhétupos e significa “modelo primitivo” de algo. O filósofo Platão (427-347 a.C.) abordou esse conceito em sua teoria das ideias, propondo que tudo que existe no mundo apresenta uma forma abstrata ou estrutura ideal, imutável (PLATÃO, 2017).
Assim, mesmo com todas as transformações sociais decorrentes das novas interpretações culturais e econômicas, ainda hoje todas as pessoas apresentam padrões comportamentais que estão relacionados mais a aspectos inconscientes do que às influências do meio.
Sigmund Freud (1856-1939), considerado o pai da psicanálise, foi o descobridor do conceito do inconsciente, porém coube ao psicoterapeuta suíço Carl Jung (1875-1961) incrementá-lo, identificando o padrão comportamental conhecido como inconsciente coletivo. Esse padrão, transcultural, hereditário e impessoal, é formado por crenças e desejos comuns a toda a sociedade, transcendendo as memórias, referências e experiências individuais.
O inconsciente coletivo é constituído, numa proporção mínima, por conteúdos formados de maneira pessoal; não são aquisições individuais, são essencialmente os mesmos em qualquer lugar e não variam de homem para homem. Este inconsciente é como o ar, que é o mesmo em todo lugar, é respirado por todo o mundo e não pertence a ninguém. Seus conteúdos (chamados arquétipos) são condições ou modelos prévios da formação psíquica em geral.
A ideia de inconsciente coletivo é considerada por vários especialistas a principal contribuição de Jung à psicologia moderna. Trata-se de pensamentos, sensações, rituais e mitos partilhados por um grupo social e transmitidos como um tipo de herança psíquica. Segundo a psicologia junguiana, seres da mesma espécie também apresentam semelhanças em seus conteúdos mentais inconscientes, ou seja, “assim como o corpo humano representa um ‘museu de órgãos’, cada um com um longo período evolutivo por trás dele, devemos esperar que a mente também esteja organizada desta forma” (JUNG, 1942).
Os componentes comuns do inconsciente coletivo são chamados de arquétipos – percepções, ideias e respostas automatizadas para as diversas situações que ocorrem durante a vida.
Jung define arquétipos como “formas ou imagens de natureza coletiva, que ocorrem em praticamente toda a Terra como componentes de mitos e, ao mesmo tempo, como produtos individuais de origem inconsciente” (JUNG, 1942, apud MARK e PEARSON, 2016, p. 18).
A teoria dos arquétipos de Jung foi uma tentativa pioneira de compreender os mecanismos inconscientes atuantes na mente humana, capazes de influenciar vários pensamentos e ações. Os arquétipos são imagens mentais programadas que emergem instintivamente e estão estreitamente relacionadas à persona ou visão de si mesmo e à “sombra” ou o lado oculto, que buscamos reprimir.
Na psicologia analítica de Carl Jung, a persona corresponde à reputação, à aparência que mostramos ao mundo, ou seja, o personagem que representamos socialmente, incluindo nossas relações pessoais, profissionais, as roupas que usamos e a forma como nos comunicamos.
A proposta junguiana, portanto, dedica-se a aspectos profundos da psique, envolvendo emoções e sentimentos primordiais como o medo, o amor e a necessidade de aceitação e projeção social.
Arquétipos e brand equity
Fale às pessoas sobre elas mesmas e elas o ouvirão por horas a fio.” – Dale Carnegie
No meio corporativo, o conceito junguiano de arquétipo foi adaptado e introduzido pelas pesquisadoras Margaret Mark e Carol Pearson (MARK & PEARSON, 2001) no livro The Hero and the Outlaw (“O Herói e o Fora-da-lei”).
Elas defendem que, ao evocar arquétipos ativamente, uma empresa consegue imprimir aos seus produtos significados profundos, gerando maior identificação e sinergia entre a marca e as pessoas. Para guiar esse processo, Mark e Pearson enumeram doze arquétipos aplicáveis às marcas, dividindo-os em quatro grandes grupos para facilitar o processo de construção do brand equity.
Brand equity é um termo do marketing referente ao valor agregado ou força de uma marca no mercado. Corresponde ao valor intangível de uma companhia e baseia-se na percepção dos consumidores. David A. Aaker, professor de marketing da Haas School of Business em Berkeley, Califórnia, explica:
O brand equity é um conjunto de ativos e passivos ligados a uma marca, seu nome e seu símbolo, que se somam ou se subtraem do valor proporcionado por um produto ou serviço para uma empresa. Para que certos ativos e passivos determinem o brand equity, eles devem estar ligados ao nome e/ou símbolo da marca. Se o nome ou símbolo da marca for mudado, alguns ou todos os ativos poderão ser afetados, e mesmo perdidos (AAKER, 2014).
Grupo 1 – Maestria/Risco: os que querem deixar sua marca no mundo
1º Arquétipo: O HERÓI (HERO)
O indivíduo do arquétipo de herói crê firmemente que qualquer coisa pode ser conquistada com coragem e trabalho duro. Determinado, forte e ágil, o herói não poupa esforços ao perseguir seus objetivos, valorizando disciplina, foco, coragem e superação.
Por ser um lutador e gostar de desafiar e romper limites, é um ótimo arquétipo para ser explorado por marcas ligadas ao desempenho.
Maior medo: fracassar ou acovardar-se.
Grande meta: demonstrar seu valor por meio de atos de bravura.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Nike, FedEx e Hummer.
Aplicações práticas: o arquétipo do herói é ideal para empresas com produtos ou serviços inovadores, de preços moderados a altos e que ajudem as pessoas a elevar a performance e atingir excelentes resultados.
2º Arquétipo: O MAGO (MAGICIAN)
O mago deseja sempre conhecer o princípio de tudo, analisando leis universais para usá-las a seu favor e realizar seus sonhos. Acredita que pode fazer as coisas acontecerem e catalisar mudanças ao repensar suas atitudes. Concentra-se na relação entre corpo e mente e defende a imaginação para transformar a realidade e gerar bem-estar.
Trata-se de um arquétipo em crescimento na sociedade contemporânea e perfeito para toda a indústria terapêutica, de wellness e autoajuda.
Maior medo: consequências negativas não intencionais.
Grande meta: concretizar os sonhos.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Red Bull, Absolut e Axe.
Aplicações práticas: o arquétipo do mago é adequado para marcas relacionadas a sensações de prazer e relaxamento, estimulando a fantasia e fugindo do óbvio.
3º Arquétipo: O FORA-DA-LEI (OUTLAW)
O arquétipo fora-da-lei, também conhecido como rebelde, vive segundo o lema “as regras foram feitas para serem quebradas”. Este indivíduo preza pela liberdade, adora ser o centro das atenções e detesta seguir normas e padrões preestabelecidos, contestando-os frequentemente.
Símbolo de liberdade e estilo de vida.
Maior medo: paralisia e resignação.
Grande meta: mudar as regras do jogo, desafiar figuras de autoridade.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: MTV, Virgin e Harley Davidson.
Aplicações práticas: o arquétipo do fora-da-lei serve para empresas que comercializam produtos e serviços fora do padrão vigente, com propostas ousadas e revolucionárias.
Grupo 2 – Independência/Autorrealização: em busca do paraíso
4º Arquétipo: O INOCENTE (INNOCENT)
O indivíduo do arquétipo inocente ou utópico tem uma personalidade simples, ingênua e generosa. Gosta de aproveitar o momento e vive contente, mantendo uma postura esperançosa e otimista diante dos problemas. Confia na bondade de todos ao seu redor, identificando-se com mensagens de paz, afeto e harmonia.
O inocente costuma ser também nostálgico e apegado às tradições familiares, sociais e culturais.
Maior medo: ser punido por fazer algo de errado ou ruim.
Grande meta: ser feliz.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Coca-Cola, Mc Donald’s e Disney.
Aplicações práticas: o arquétipo do inocente quer se sentir bem e ter fé na humanidade. Para atender seu desejo de viver no paraíso, as empresas devem apostar em produtos e ações de marketing que remetam a valores morais sólidos e à pureza da criança interior.
5º Arquétipo: O SÁBIO (SAGE)
O arquétipo do sábio tem um forte ímpeto para aprender coisas novas e busca manter-se em contínua evolução, investindo sempre no crescimento pessoal. Detalhista e metódico, gosta de descobrir novas técnicas e funcionalidades de produtos, analisando criticamente dados e informações.
Maior medo: ser enganado ou ignorante.
Grande meta: descobrir a verdade.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Estadão, CNN e Globo News.
Aplicações práticas: credibilidade e confiança são aspectos fundamentais para empresas do arquétipo sábio, como várias agências de notícias, jornais, revistas, instituições de ensino, etc. Para lidar com um público antenado e investigativo, as organizações desse arquétipo precisam realizar constantes esforços em prol da acurácia de seus processos, construindo uma reputação impecável.
6º Arquétipo: O EXPLORADOR (EXPLORER)
Curioso e aventureiro, o arquétipo do explorador é um amante da diversidade e dedica-se a descobrir novos lugares e culturas, desvendando mistérios do mundo externo enquanto promove uma busca pessoal pelo autoconhecimento. O explorador é inquieto, avesso à rotina e tem como principais qualidades a autonomia e a ambição.
Maior medo: perder a individualidade e o espírito desbravador.
Grande meta: conhecer a si mesmo através da exploração do mundo ao redor.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Lonely Planet, Jeep e Pajero.
Aplicações práticas: para conquistar a admiração e o respeito do cliente explorador, a empresa deve apelar para a aventura, despertando sentimentos de liberdade e independência. O marketing da marca, por sua vez, pode ser trabalhado em torno de viagens a destinos paradisíacos e/ou inusitados, experiências de vida memoráveis e grandes descobertas.
Grupo 3 – Pertencimento/Significância: os que desejam aceitação social e status
7º Arquétipo: O CARA COMUM (EVERYMAN)
Este arquétipo tem como maior desejo pertencer ao grupo, por isso não gosta de se destacar e procura consumir as mesmas coisas que as pessoas de seu círculo social usam. O cara comum é o típico cidadão médio; empático, prioriza o acolhimento e sempre busca companhia, tentando estabelecer conexões com os outros.
Maior medo: ficar de fora ou ser banido de seu grupo social.
Grande meta: criar laços emocionais e ser aceito por seus pares.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Volkswagen, Visa e Gap.
Aplicações práticas: marcas que adotam este arquétipo enfatizam a adequação social e auxiliam seus clientes a moldar-se ao grupo, valorizando uma vida simples e cotidiana. O arquétipo do cara comum é apropriado para marcas que buscam explorar modelos colaborativos, assumindo um estilo menos alternativo e mais padronizado.
8º Arquétipo: O AMANTE (LOVER)
O arquétipo do amante romantiza a vida e gosta de se sentir único, exclusivo e especial. Assim como o cara comum, o amante também prioriza seus relacionamentos interpessoais, porém busca relações mais intensas, baseadas na intimidade e na confiança. Sedutor, teme acima de tudo a rejeição e a solidão, por isso demonstra grande preocupação com a própria aparência e tenta parecer sempre atraente aos olhos dos demais.
Maior medo: desprezo e solidão.
Grande meta: experiência e intimidade com as pessoas que ama.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Channel, Ferrari e Alpha Romeo.
Aplicações práticas: fabricantes de cosméticos são as empresas que mais frequentemente apelam para o arquétipo lover em suas campanhas publicitárias, ressaltando atributos como a beleza e a sensualidade.
9º Arquétipo: O BOBO DA CORTE (JESTER)
A pessoa baseada no arquétipo do bobo da corte valoriza a diversão acima de tudo, representando a filosofia carpe diem. Vive intensamente o presente, aproveitando cada momento sem temer o que os outros podem pensar. Alegre e espontâneo, o bobo da corte só quer experimentar o melhor da vida no aqui e agora, por isso não costuma se preocupar com o futuro nem planejá-lo.
Maior medo: uma rotina irritante e enfadonha.
Grande meta: prazer e diversão.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Ben & Jerry’s, Pepsi e M&M.
Aplicações práticas: as organizações que adotam o arquétipo do bobo da corte normalmente recorrem a piadas e jogos em suas ações de marketing. Atraem a atenção desse nicho através de campanhas animadas e criativas.
Grupo 4 – Controle/Estabilidade: sede de poder
10º Arquétipo: O CRIADOR (CREATOR)
O indivíduo do arquétipo do criador é imaginativo e engenhoso, com um forte ímpeto para inovar e desenvolver novos projetos. Artista, quer promover suas ideias e imprimir sua marca no mundo, deixando um legado de valor único e duradouro.
Maior medo: mediocridade.
Grande meta: genialidade, apresentar um conceito original e revolucionário.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Apple, Lego e Faber-Castell.
Aplicações práticas: empresas voltadas para o arquétipo do criador difundem a ideia de que tudo é possível e que cada pessoa pode transformar a própria vida e o mundo, criando uma nova realidade.
11º Arquétipo: O CUIDADOR (CAREGIVER)
Benevolente e altruísta, a pessoa do arquétipo do cuidador tem uma vocação natural para ajudar o próximo, amparando-o em momentos difíceis. É prestativo e não mede esforços para socorrer alguém necessitado.
Maior medo: ingratidão e egoísmo.
Grande meta: ajudar e proteger os outros.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Volvo, Unicef e Hospital Albert Einstein.
Aplicações práticas: marcas do arquétipo cuidador apostam em uma imagem concentrada nas pessoas, relações e necessidade humanas. Com frequência destacam questões ambientais ou sociais, demonstrando preocupação e zelo com o bem-estar comum.
12º Arquétipo: O GOVERNANTE (RULER)
O arquétipo do governante é um líder nato. Assertivo e às vezes autoritário, sabe se impor para estabelecer a ordem, além de possuir o dom da persuasão. Geralmente bastante carismático, é capaz de motivar, mobilizar e engajar as pessoas em prol dos ideais e causas que propõe.
Maior medo: ser destituído, perder a influência sobre as pessoas.
Grande meta: liderança e poder.
Exemplos de marcas que incorporam o arquétipo: Rolex, Johnnie Walker e Rolls-Royce.
Aplicações práticas: uma vez que as pessoas do arquétipo governante buscam liderar para formar um clã, comunidade ou grupo hierarquizado e próspero, as marcas dedicadas a esse público investem em glamour, ostentação e status. Podem e devem cobrar preços bastante elevados para transmitir a ideia de luxo, prestígio e domínio sobre os demais.
Escolher um arquétipo adequado a sua marca e ao seu público-alvo é o primeiro passo para o sucesso na comunicação corporativa e, consequentemente, nas vendas. Produtos e serviços bem alinhados emocionalmente são inconscientemente reconhecidos pelos clientes, ativando os gatilhos certos para o consumo. Além disso, um relacionamento mais próximo é criado quando a empresa consegue estabelecer conexões mentais mais profundas com as pessoas, aliando um arquétipo dominante a outros dois ou três complementares para formar uma identidade de marca forte e impactante.
Embora desconhecidos ou ignorados pela maioria das pessoas, os arquétipos seguem presentes e atuantes, funcionando como modelos ou padrões comportamentais que despertam emoções e influenciam diversos processos na vida pessoal e profissional de um indivíduo.
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Referências bibliográficas
- PLATÃO. A Teoria das Ideias. Hunter Books, 2017.
- JUNG, Carl Gustav. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. Editora Vozes, 2001.
- JUNG, Carl Gustav. O Homem e seus Símbolos. Editora Nova Fronteira, 1982.
- JUNG, Carl Gustav. A Vida Simbólica. Editora Vozes, 1998.
- MARK, Margaret & PEARSON, Carol S. The Hero and the Outlaw: Building Extraordinary Brands Through the Power of Archetypes. McGraw-Hill Education, 2001.
- COOPER, 2008. The Origin of Personas. Acesso em: 19 /10/2019.
- AAKER, David. Aaker on Branding: 20 Principles That Drive Success. Morgan James Publishing, 2014.
Tema: Melhores Práticas, Vendas.
Subtema: O conceito de arquétipos de Carl G. Jung influenciando marcas e aproximando pessoas a elas.
Objetivo: Desenvolvimento Organizacional, Vendas, Melhores Práticas, Coaching nas Empresas.
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