Conheça os mecanismos cerebrais mais frequentes no processo decisório, avaliando os principais modelos de decisão neuroestratégicos.
O futuro é construído pelas nossas decisões diárias, inconstantes e mutáveis, e cada evento influencia todos os outros.”
– Alvin Toffler
Nascido em 1928, o cientista-futurista Alvin Toffler chocou a todos ao seu redor ao prever, ainda na década de 1970, que o mundo seria controlado por computadores no futuro. Além de antecipar aspectos da revolução digital e tecnológica que hoje vivenciamos, Toffler alertava também sobre a necessidade de atuar estrategicamente, evitando ficar vulnerável a imprevistos e ações de terceiros (TOFFLER, 1983).
A idealização de um planejamento estratégico eficiente costuma ser um processo demorado, uma vez que demanda uma visão detalhada da empresa e do mercado para estabelecer diretrizes e definir as próximas medidas que os gestores devem tomar. Diante da escassez de recursos e em um mercado guiado por variáveis cada vez mais dinâmicas e complexas, criar um plano de ação organizacional é uma tarefa no mínimo desafiadora.
Neste contexto, a aplicação de princípios da neurociência pode ser extremamente útil para aperfeiçoar a performance através da compreensão do comportamento humano – consciente e inconsciente -, convertendo incertezas em oportunidades e priorizando a qualidade de vida no trabalho aliada à conquista de resultados.
O termo neuroestratégia apareceu pela primeira vez em um artigo científico de Thomas Powell, professor da Universidade de Oxford. Nele, Powell conceitua neuroestratégia como a pesquisa e utilização consciente de conhecimentos a respeito do funcionamento do cérebro humano para orientar melhores decisões nos âmbitos profissional e organizacional (POWELL, 2011).
Neuroestratégia organizacional: vícios e virtudes cerebrais na tomada de decisões
O pensamento estratégico raramente ocorre de forma espontânea.”
– Michael Porter
Ao contrário do que muitos imaginam, a maior parte das escolhas que fazemos diariamente – desde o que vestir antes de sair até aceitar ou não uma oferta de emprego – é irracional e instintiva. Isto significa que tanto decisões rotineiras quanto as mais importantes geralmente acabam sendo tomadas de modo automático e ilógico – ainda que o indivíduo se considere prudente e no controle da situação.
Sabendo disso, o economista Richard Thaler associou psicologia e economia para elaborar a chamada teoria dos agentes econômicos. De acordo com ela, as pessoas são irracionais e fazem escolhas baseadas em questões subjetivas e culturais, porém essa irracionalidade se dá de modo previsível, e foi essa demonstração que o levou a ganhar o Nobel da Economia de 2017 (NOBEL PRIZE, 2017).
A tese de Thaler pode ser confirmada em várias situações cotidianas. Afinal, por que insistimos em fazer coisas que prejudicam a nós mesmos e optamos deliberadamente por caminhos que nos distanciam de nossos objetivos? As principais explicações para isso, segundo Thaler, são dois grandes “vícios cerebrais”:
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Inércia
O cérebro humano possui uma tendência natural a desenvolver um estado de inércia, basicamente ligando o “piloto automático” para fazer as coisas sempre do mesmo jeito. A verdade é que geralmente temos um conhecimento intuitivo daquilo que é preciso fazer para superar dificuldades e obter sucesso, mas debatemo-nos com a inércia que nos impede de agir, preferindo esperar pelo momento em que vamos ter vontade de realizar o que deve ser feito. O problema é que este momento pode nunca chegar.
O ser humano é movido pela sensação de prazer e satisfação, nada racional, que o próprio cérebro se dá como prêmio quando executa algo que dá certo – e pelo prazer e satisfação que ele antecipa como retorno por ações futuras. O sistema de recompensa e motivação cerebral encarrega-se disso, informado pela dopamina que indica o sucesso real ou esperado. Todo animal dotado de um cérebro razoavelmente estruturado tem algo parecido, com neurônios dopaminérgicos que, ao valorizar qualquer coisa que funcione, estimulam os movimentos.
Reconhecer a inércia e compreender esse processo motivacional são pontos essenciais para frear a tendência a seguir o caminho mais estável e menos cheio de incertezas ou surpresas.
O cérebro humano gosta de padrões comportamentais, hábitos e rotinas, porém agir sempre dessa forma é limitar-se a uma zona de conforto.
A famigerada zona de conforto é uma faixa comportamental marcada pela ausência do novo e do incerto. Assim, uma pessoa que só age dentro de sua zona de conforto evita a todo custo eventos desconhecidos e que exijam capacidade de aprendizagem e improviso. Pode ser, por exemplo, alguém que se julga incapaz de apresentar um projeto no trabalho por não ter o hábito de falar em público – e fica aterrorizado só de imaginar como seria.
A tendência a fazer somente o conhecido, cômodo e fácil é obviamente tentadora, pois não exige coragem, engajamento ou disciplina. No entanto, permanecer na zona de conforto revela-se algo extremamente prejudicial, já que impede que o indivíduo descubra coisas novas, desenvolva habilidades e viva experiências enriquecedoras.
Não sair da zona de conforto, portanto, significa renunciar ao crescimento e ficar estagnado.
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Medo
Na perspectiva biológica, os instintos representam padrões de comportamento caracterizados por serem hereditários e comuns a toda a espécie humana. Estes instintos evoluíram ao longo de milênios e estão programados no cérebro. Sua principal função é proteger a saúde e preservar a vida do indivíduo através de reações automáticas ou imediatas.
A teoria biológica aponta que temos alguns instintos básicos relacionados à sobrevivência e à reprodução. Em relação à primeira, destaca-se o medo de situações novas e ameaçadoras. Rodrigo Marques, psiquiatra e mestrando em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), explica:
Medo é o nome que damos a um conjunto de respostas do nosso corpo e da nossa mente quando somos expostos a situações de perigo. Ao detectarmos essas situações, entramos em um estado mais ou menos automático que, na grande maioria das vezes, nos impele a fugir daquilo que percebemos como perigoso. Também pode produzir reações do tipo paralisia ou de luta. Nesses momentos, nosso corpo apresenta uma série de mudanças fisiológicas, principalmente ligadas à liberação de adrenalina (aumento da frequência cardíaca, sudorese, etc.), como também experimentamos um estado emocionalmente desagradável de alerta e apreensão mental, o qual passa a conduzir nosso comportamento”.
O docente de psiquiatria da UFPE Amaury Cantilino ressalta que o medo é desencadeado a partir de uma região do cérebro chamada amígdala:
Ela, por sua vez, ativa o hipotálamo, que vai preparar o corpo para fugir ou lutar. A reação de luta-fuga leva a aumento da frequência cardíaca para que o sangue seja bombeado mais rapidamente, da frequência respiratória para que o indivíduo acumule oxigênio, do tônus muscular para que não caia. Além disso, o sangue sai da pele para que não sangre com facilidade, se houver lesão, e do intestino para poder irrigar melhor a musculatura”. Além disso, o indivíduo experimenta uma amplitude do campo visual e altas liberações de cortisol e adrenalina no organismo.
Todo esse processo visa nos salvar de riscos, porém pode também gerar prejuízos à saúde física e mental. Ao longo do tempo, esse sentimento primitivo foi acrescido; assim, enquanto antes o motivo do medo era um predador selvagem, hoje ele pode ser qualquer fato desconhecido no ambiente de trabalho, por exemplo.
Embora o medo tenha desempenhado um importante papel no passado – e ainda hoje seja útil diante de ameaças reais -, o temor exagerado por novidades pode engessar o indivíduo, impedindo-o de desenvolver suas potencialidades e encarar desafios.
Ainda que o comodismo e o temor do desconhecido sejam predisposições cerebrais, esses empecilhos podem ser burlados através da aquisição de duas competências específicas:
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Inteligência emocional
Vários especialistas vêm alertando para uma “epidemia” de má interpretação e gestão das emoções. De acordo com um estudo recentemente realizado por Travis Bradberry e Jean Greaves, autores do livro “Emotional Intelligence 2.0” (Inteligência emocional 2.0), da TalentSmart, somente 36% das pessoas são capazes de identificar corretamente o que estão sentindo. Paralelamente, 66% dos seres humanos não conseguem controlar as próprias emoções e, por conseguinte, são incapazes de estabelecer relacionamentos saudáveis na vida pessoal e profissional (BRADBERRY e GREAVES, 2018).
Ouvindo mais de 500 mil pessoas ao longo de uma década, a pesquisa confirmou que a inteligência emocional , além de rara, é muito valiosa. O chamado QE, ou quoeficiente emocional, está diretamente ligado a 58% do êxito profissional em qualquer carreira. Esse tipo de inteligência pode ser treinado em cinco diferentes eixos: autoconhecimento, gestão de relacionamentos, autocontrole, autoestima e agilidade emocional.
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Comunicabilidade
Reconhecer e lidar com os sentimentos adequadamente são habilidades fundamentais, mas para construir carreiras, equipes, empresas e relacionamentos em geral mais equilibrados e produtivos, é necessário também saber se comunicar.
Expressar as próprias ideias e emoções nem sempre é uma tarefa fácil, uma vez que toda interação social envolve pessoas com diferentes personalidades, costumes e opiniões.
Além de incompatibilidades pessoais, culturais e psicológicas, existem também barreiras não verbais – quando alguém tenta transmitir uma mensagem a outro indivíduo ou grupo mas é mal interpretado por empregar uma linguagem corporal negativa ou agressiva demais.
Modelos de tomada de decisão neuroestratégicos
Nada é mais difícil e, portanto, mais precioso, do que ser capaz de decidir.”
– Napoleão Bonaparte
A ciência vem há decadas se esforçando para entender melhor o processo de tomada de decisões no cérebro humano. Sabe-se que grande parte das nossas decisões é automática, ou seja, processada inconscientemente. Há, contudo, decisões complexas e arriscadas que exigem racionalização.
Em tomada de decisões, simples ou complexas, cabe ao sistema nervoso analisar as alternativas possíveis, geralmente buscando maximizar os ganhos e minimizar as perdas. A neurociência desenvolveu métodos para avaliar como a cognição, emoção, atenção e memória, entre outras variáveis, participam essa dinâmica.
A decisão não corresponde a uma mera escolha entre alternativas, mas sim a um processo atrelado à experiência do indivíduo e a sua capacidade de enxergar os principais fatores de cada situação.
Do ponto de vista biológico, processos inconscientes dependem do funcionamento do tronco encefálico e dos gânglios da base. As reações emocionais, por sua vez, são resultantes do processamento do sistema límbico: elas são o pano de fundo, o cenário no qual as decisões são tomadas. Já a atividade de áreas frontais (córtex pré-frontal) está relacionada ao planejamento decisório, ao controle dos impulsos e à racionalidade. É importante observar, porém, que o cérebro não obedece essa compartimentalização na hora de decidir, e todas as áreas participam de modo relativo e interdependente.
No âmbito organizacional, o estudo sobre o processo decisório tem sido cada vez mais objeto de investigação de diversos teóricos e gestores, uma vez que as organizações precisam de decisões acertadas em um curto espaço de tempo. Nesse sentido, a utilização de modelos de tomada de decisão neuroestratégicos permite que os líderes vislumbrem melhor a estrutura empresarial e suas complexas relações.
A empresa desprovida de dados e técnicas eficientes para subsidiar suas decisões estratégicas, assim como a sua gestão, estará em clara desvantagem em relação às outras companhias do mesmo segmento. A aplicação de modelos de tomada de decisão neuroestratégicos proporciona os seguintes benefícios (BEUREN, 2000, p. 18):
- simplifica a visualização geral das variáveis;
- auxilia na identificação de possíveis relações entre os fatores analisados;
- serve como base para estabelecer e aprimorar parâmetros.
As ferramentas de tomada de decisão influenciam diretamente os passos seguintes diante de qualquer situação da rotina organizacional. Dentre elas, destacam-se três matrizes:
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Matriz de decisão
A matriz de decisão é um instrumento que possibilita análises rápidas por meio de critérios que permitam uma visão ampla e coerente das opções disponíveis. Ela corresponde a uma espécie de bússola, indicando as tendências compatíveis com o momento atual da empresa e com o que se projeta para a resolução de um problema específico.
Para montar a matriz de decisão, liste cinco ideias, classificando-as segundo os critérios de avaliação – impacto, esforço, lucratividade e visão. Em seguida, avalie de 1 a 5 a relevância de cada um desses critérios sobre as possíveis decisões.
Some todas as notas e depois subtraia o valor do esforço. A maior pontuação na coluna “Total” corresponderá à ideia que deve ser adotada para solucionar o problema em questão.
Embora a matriz de decisão seja um método prático e objetivo para avaliar e reconhecer riscos e oportunidades, ela não deve ser empregada isoladamente, mas sim associada a fontes de dados confiáveis e outros modelos estratégicos.
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Matriz GUT – Gravidade, Urgência e Tendência
Enquanto a matriz de decisão busca definir a solução mais vantajosa para um problema, a matriz GUT auxilia na priorização de processos. Através dela, cada problema relevante para a empresa pode ser classificado de acordo com a sua gravidade, urgência (da resolução) e tendência (de agravamento rápido ou lento):
Gravidade: seriedade do problema e seus efeitos na organização;
Urgência: rapidez da resolução conforme a velocidade de agravamento do problema;
Tendência: Potencial de piora do problema, gerando danos nos processos organizacionais.
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Matriz de Eisenhower
Famosa ferramenta de tomada de decisão, a matriz de Eisenhower é inspirada em Dwight D. Eisenhower, general do exército e presidente dos Estados Unidos entre 1953 e 1961. Eisenhower era conhecido por sua habilidade de gerenciamento do próprio tempo, dividindo suas atividades entre importantes ou menos importantes e urgentes ou menos urgentes.
“O que é importante raramente é urgente e o que é urgente raramente é importante”, ele dizia. A matriz de Eisenhower é uma ferramenta visual simples para a administração do tempo, composta por quatro quadrantes nos quais as tarefas diárias devem ser divididas segundo sua urgência e importância:
1º quadrante: tarefas urgentes e importantes
Aqui devem ser inseridas todas as tarefas que são importantes e que, seja por atrasos, má gestão ou imprevistos, tornaram-se urgentes também.
2º quadrante: tarefas não urgentes e importantes
São tarefas importantes, mas que podem ser realizadas sem tanta pressa. Embora este quadrante seja formado por atividades prorrogáveis, ele é o mais valioso da matriz e nunca deve ser desprezado. Trata-se de ações planejados, projetos relacionados à qualidade de vida e ao desenvolvimento pessoal e profissional.
3º quadrante: tarefas urgentes e não importantes
Neste quadrante ficam pequenas atividades irrelevantes e sem real valor, porém exigidas por alguém ou integrantes de algum processo maior. São obrigações que podem fazer o indivíduo se sentir cansado e improdutivo.
4º quadrante: tarefas não urgentes e não importantes
Aqui temos as distrações desnecessárias, que dispersam e desperdiçam energia, prejudicando a produtividade. Formam um círculo vicioso, com ações relacionadas à irresponsabilidade, à preguiça e à procrastinação. Por causa delas oportunidades são perdidas, prazos estourados e o tempo parece nunca ser o bastante para terminar o que é realmente necessário. Pessoas que têm muito tempo consumido nessas atividades correm o risco de sofrer de ansiedade e depressão.
Para sobreviver e prosperar em mercados cada vez mais disputados é imprescindível conhecer o impacto das neuroestratégias nas decisões empresariais, obtendo assim a otimização do uso do tempo e a estruturação de equipes focadas na geração de resultados.
Sabendo disso, a FELLIPELLI disponibiliza ferramentas internacionalmente reconhecidas para desenvolvê-las, tais como Inteligência Emocional, Formação em Coaching (BBCC), Liderança – Lead 4 Success e IPT® Liderança. Consulte-nos!
Para saber mais:
- Blink – A decisão num piscar de olhos. Malcolm Gladwell. Editora Sextante, 2016.
- O livro da decisão. Mikael Krogerus e Roman Tschappeler. Best Business, 2017.
- Decisões inteligentes – Somos movidos a decisões. John S. Hammond, Ralph L. Keeney e Howard Raiffa. Alta Books, 2017.
- Estratégias de Decisão – Decida melhor com insights da teoria dos jogos. Fernando Barrichelo. Clube de Autores, 2015.
Referências bibliográficas
- TOFFLER, Alvin. Previsões e premissas. Editora Record, 1983.
- POWELL, Thomas C. BEHAVIORAL STRATEGY. Strategic Management Journal Mgmt. J., 32: 1369–1386 (2011). Acesso em: 15/08/2019.
- SMITH et al., 2014. Mechanisms of impulsive choice: II. Time-based interventions to improve self-control. Acesso em: 15/08/2019.
- NOBEL PRIZE, 2017. Acesso em: 15/08/2019.
- BRADBERRY, T. e GREAVES, J. Inteligência Emocional 2.0. Você Sabe Usar a Sua? Alta Books, 2018.
- BEUREN, I. M. Gerenciamento da informação: um recurso estratégico no
- processo de gestão empresarial. São Paulo: Atlas, 2000.
- GRIMALDI, R. e MANCUSO, J.H. Qualidade Total. Folha de SP e Sebrae, 6º e 7º fascículos, 1994.
Tema: Neurociência, Inteligência Emocional.
Subtemas: Utilizando o conhecimento do funcionamento do cérebro a favor do seu crescimento profissional.
Objetivo: Autoconhecimento, Autodesenvolvimento, Desenvolvimento Organizacional, Desenvolvimento de Carreira, Coaching, Neurocoaching, Coaching nas Empresas.
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