Análise das 100.000 palavras mais usadas em 10 idiomas mostra que os vocábulos positivos dominam a comunicação humana Espanhol é o idioma mais positivo entre os 10 analisados.
A análise das 100.000 palavras mais usadas em 10 dos idiomas mais falados do planeta mostra que os seres humanos usam mais vocábulos positivos que negativos. O espanhol e o português seriam as línguas mais otimistas, enquanto o chinês e o coreano, as mais pessimistas, segundo o estudo.
Já em 1969, os psicólogos sociais Jerry Boucher e Charles Osgood levantaram a hipótese de Poliana. Sustentavam que os humanos têm uma tendência universal a usar com maior frequência e variedade palavras positivas que negativas. Desde então, e convertido agora no Princípio de Poliana, a ideia teve tantos defensores quanto detratores.
O espanhol e o português são os idiomas mais otimistas, enquanto o chinês e o coreano, os mais pessimistas
Um grupo de pesquisadores norte-americanos e australianos fez a maior compilação de palavras, até o momento, para testar a hipótese. Há alguns anos, seria necessário um enorme esforço em termos de pessoal e recursos, mas na era do Big Data, estes cientistas usaram máquinas e algoritmos de busca e seleção para reunir bilhões de palavras tiradas do Twitter, Google, legendas de filmes, letras de canções e livros em espanhol, chinês, árabe e indonésio, entre outros.
“Analisamos os 10 idiomas e em cada fonte verificada, as pessoas usam mais palavras positivas que negativas”, diz o matemático da Universidade de Vermont (EUA) e principal autor do estudo, Peter Dodds. Com algoritmos, as máquinas selecionaram as 10.000 palavras mais usadas nas 10 línguas analisadas e, depois, centenas de nativos de cada língua deram notas em uma escala de 1 a 9, das mais negativas às mais positivas. Por exemplo, vocábulos como morte ou violência tendem a receber uma pontuação baixa, enquanto que beijos, férias ou felicidade recebem melhor pontuação. O 5 seria o valor neutro e corresponderia a palavras como o ou mas. Cada palavra foi classificada por 50 pessoas diferentes. Isso dá um total de cinco milhões de resultados.
Com esta quantidade de dados, os pesquisadores conseguiram criar uma classificação de idiomas segundo seu otimismo. Em primeiro lugar, aparece o espanhol. Neste caso, foram usadas três fontes de palavras do espanhol do México: Twitter, o buscador Google e os livros indexados no Google Books. Em segundo lugar, aparece o português do Brasil, seguido do inglês obtido dos textos do jornal The New York Times. A lista é fechada pelo chinês, o coreano, o russo e o inglês, mas só o das letras de músicas.
“No entanto, o relevante é que todas as línguas têm um viés positivo”, comenta Dodds. A cada palavra com carga negativa em espanhol, são usadas nove palavras positivas. Inclusive no caso do chinês, a relação é de 30/70 a favor da alegria, segundo mostra a pesquisa, publicada na revista PNAS.
A equipe comandada por Dodds, autor de uma espécie de medidor da felicidade no Twitter, já havia comprovado a validade do Princípio de Poliana no inglês e agora acredita ter demonstrado seu caráter universal. Para este pesquisador, a razão desta tendência ao otimismo na comunicação possui uma base social: “A linguagem é nossa grande tecnologia social e, embora existam muitos conflitos e problemas no mundo, este corpus de textos mostra um desvio positivo porque somos seres sociais.”
O estudo poderia ter um viés experimental pela tendência dos humanos a pontuar alto em entrevistas
No entanto, outros cientistas que também estudaram este fenômeno afirmam que o estudo apresenta uma importante falha em sua estrutura. Nas pesquisas baseadas em entrevistas, os participantes tendem a dar valores positivos em qualquer escala. É o que em psicologia e sociologia chama-se viés de aquiescência.
“É como usar uma lente pintada de rosa para olhar o mundo e tirar a conclusão de que existe um padrão universal de rosa na realidade”, comenta o pesquisador do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETH), o espanhol David García. Este cientista social já havia detectado o Princípio de Poliana no inglês, no alemão e no espanhol em uma pesquisa anterior. Mas também comprovou que, embora menos usadas, as palavras negativas contêm mais informação que as positivas. Para García, a suposta universalidade dos resultados “é, na verdade, um viés experimental”.
Por: MIGUEL ÁNGEL CRIADO
Fonte: http://brasil.elpais.com/brasil/2015/02/10/cultura/1423584383_770666.html