Cultura e neurociência: quando a experiência no cérebro transborda em um comportamento5 min de leitura

Reações a experiências observadas, e não necessariamente vivenciadas, são explicadas pelo conceito da ação do neurônio espelho: uma prova de que a transformação de uma cultura é possível a partir de um comportamento que se repete e multiplica.

Sabe aquela sensação ou a vontade incontrolável de sorrir, quando você vê alguém sorrindo? E que às vezes chega ao ponto de dar gargalhadas incontroláveis, sem nenhum motivo aparente? E notar, que mesmo antes que você perceba, os seus lábios já fizeram aquele movimento de sorrir distraidamente?

Ou então, quando assistimos alguém fazendo trapalhadas como naqueles vídeos caseiros do tombo de bicicleta, e do salto mortal involuntário na cama elástica, que acaba no chão e nos percebemos sentindo as dores que a pessoa deve ter sentido? Daí, fazemos aquelas caretas esquisitas e até mesmo uns “ais” que emitimos ao ver uma pessoa escorregando e caindo sentada no chão, ou batendo de cara numa porta de vidro e outras coisas assim.  Pode ser que até mesmo esta simples descrição já tenha causado em você alguma sensação, encolhimento dos ombros e o apertar dos olhos, como se não quisesse ver.

Figura 1 Processo de reprodução de comportamento e conhecimento.
Figura 1 Processo de reprodução de comportamento e conhecimento.

Estas experiências são possíveis pela ação dos chamados neurônios espelho.

Os neurônios espelho são os responsáveis por termos a experiência de estar vivendo aquela situação que estamos assistindo. Espelhamos dentro de nós aquela imagem ou experiência, como se estivéssemos vivenciando-as.

E, às vezes, essa experiência no cérebro transborda em um comportamento e faz a gente sorrir “com o sorriso do outro”.

Deve ser por isso que algumas pessoas adoram assistir ao surf naquelas ondas gigantescas. Elas têm aquele misto de sensação de adrenalina, prazer, medo e diversão. Claro que também seria muito bom queimar todas aquelas calorias, mesmo estando sentadas em frente à televisão!

Voltando aos neurônios…

Assim como muitas outras habilidades do cérebro, esta em especial pode nos ajudar a entender e evolucionar aspectos da cultura. Tanto organizacional, mas também familiar, social, ou qualquer outra.

Algumas diferentes formas de traduzir cultura em definições que nos ajudam a entender o que ela significa na prática:

  • Conjunto de valores que norteiam os comportamentos esperados em uma comunidade.
  • Aquilo que é criado através das mensagens emitidas e recebidas sobre como as pessoas devem se comportar.
  • Um conjunto de fazeres em um determinado grupo de pessoas, agregadas por um propósito.
  • Significados articulados em mensagens que demonstrem o que tem valor, o que é importante para um grupo.

Faz parte de nossa estratégia intrínseca de sobrevivência nos adaptarmos a um coletivo, para fazermos parte e pertencer. Lemos os sinais sobre o que é necessário para fazer parte e nos comportamos de acordo com eles. Assim, construímos e mantemos uma cultura.

Figura 1.1 A adolescência e a busca pelo “pertencimento”.
Figura 1.1 A adolescência e a busca pelo “pertencimento”.

A adolescência e seus códigos de vestir e consumir são um exemplo claro disso. Como disse um amigo, “quando vou pegar meu filho na escola, parece que ele estuda na Abercrombie”

Esta “necessidade” vem da expectativa de que se não conseguimos nos adaptar a uma determinada cultura, ou sairemos ou seremos rejeitados pelo sistema. Queremos e precisamos pertencer. E algumas vezes, as normas comportamentais que seguimos acabam por se tornar inconscientes.

Os comportamentos estabelecidos influenciam os dos novos membros da comunidade e, assim, a cultura se perpetua.

Muitas vezes, nem nos perguntarmos por que (em alguns casos, infelizmente) espelhamos comportamos que vemos e identificamos no grupo. Se o grupo é sério, tendo a ser também. Se o grupo é descontraído, da mesma forma eu me descontraio (os chamados vieses inconscientes).

A maioria de nós, quando entra numa agência bancária, por exemplo, exibe um comportamento mais sério, diferente de quando entramos numa sorveteria, no domingo à tarde. Novamente, são os neurônios espelho, nos ajudando na adaptação, lendo e adequando a situação através da modelagem dos comportamentos naquele determinado contexto.

Imagine então a importância de pequenos comportamentos como sorrir, cumprimentar, ou franzir a testa e baixar os olhos. Faça um pequeno teste e veja o que acontece quando você entra em um elevador e sorri para as pessoas lá dentro.

Agora imagine isso em escala, ou seja, cada uma e todas as pessoas espelhando este sorriso a cada vez que cruzam com outras, no elevador, no corredor, no café, na calçada, e você verá um poderoso instrumento de evolução de uma cultura, de um conjunto de comportamentos e mensagens emitidas e recebidas num determinado contexto.

Transformação que pode começar com pequenos sinais e comportamentos daquilo que pode ser multiplicado, graças aos neurônios espelho. Claro que precisamos somar a isso a coerência destes sinais para um determinado grupo.  E também a força desta coerência com o propósito, no caso das empresas.

Isso requer atenção e especialmente consciência, para podermos então utilizar este recurso a nosso favor, em vez de sermos reféns destes  sinais.

Fonte: Exame, em 24 fev 2017.

Tema: Neurociência, Cultura Organizacional.

Subtema: O papel dos neurônios espelho na construção de uma nova cultura.

Objetivo: Autoconhecimento, Autodesenvolvimento, Desenvolvimento Organizacional, Coaching, Coaching nas Empresas, NeuroCoaching.

 


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